Roteiro: 48 horas em Liverpool
Próxima de Manchester, a charmosa cidade tem música (e os Beatles) por todos os lados, além de bons bares e centros culturais
DIA 1
8h30 – Blackbird
Que eles não me leiam, mas os povos de Manchester e Liverpool têm similaridades. Separados por 55 quilômetros (ou 32 minutos de trem), eles falam com o sotaque dos britânicos nortistas (at all diz-se ahtol), e às vezes aparentam um jeitão brucutu nas duas primeiras frases, mas na terceira já se exibem simpáticos, até no táxi, que sai 50% mais barato que em Londres.
Vim de Manchester com o pass da BritRail, que dá direito a viagens ilimitadas pela Grã Bretanha, a partir de £ 107 para três dias, havendo gratuidade para uma criança de até 5 anos por adulto.
Tudo é mais em conta e não tem a muvuca, o mau humor da megalópole. Não à toa muitos estão deixando a capital para viver ao norte, não somente em Manchester e Liverpool, mas também em Leeds, apesar de serem destinos um pouco mais gelados.
E, se Manchester tem a abelha como símbolo, Liverpool ostenta o pássaro, visto até no distintivo do time que leva o nome da cidade. “Blackbird singing in the dead of night”, como cantaram os quatro garotos. No Royal Liver Building, uma das 2.500 construções preservadas pelo valor cultural, há no topo dois pássaros, os liver birds, que protegem a cidade segundo a lenda.
9h – Vocal do Oasis
Os pássaros estão no inconsciente coletivo, como as peripécias dos astros britânicos, esmiuçadas em audio guides em português no idolatrável British Music Experience. Ao adentrar o espaço, que se mudou de Londres para lá ano passado, a gente percorre corredores com as décadas e vê de tudo, das roupas dos Stones nos 60’s aos brinquedos das Spice Girls nos 90’s.
Há aulas de guitarra e bateria em vídeo, e até leigo brinca – cantei Wonderwall, do Oasis, no estúdio. Tem um totem interativo, “anatomia do pop star”, com botões em que você toca e escuta dicas de especialistas: como um astro deve dançar, se vestir, se portar com a imprensa.
Do nada, surge um anúncio que no palco haveria show do Boy George, uma holografia perfeita a cantar Karma Chameleon. Aí saí, cruzei a rua e avistei a Estátua dos Beatles, onde disputei espaço com a comunidade chinesa para um clique como quinto integrante.
12h30 – Hora do Albertão
Isso tudo fica no Centro. Da estátua, ande 5 minutos pela orla cheia de famílias e turistas até um patrimônio da Humanidade pela Unesco, o Albert Dock. É um point portuário eclético que junta alguns dos melhores museus, bares e restaurantes. Uma extensa área onde venta pra chuchu. Rola até roda-gigante.
Temi virar uma Mary Poppins: meu cartão de crédito voou como um peixe ensaboado, mas resgatei-o. Aliás, estamos no norte, faz frio.
Para quem aprecia cozinha italiana, o arrumadinho Gusto é certeiro no almoço, quando o menu com duas etapas custa £ 13,65 até 5 da tarde – depois, £ 16,65. Considero ter mais charme à noite, com as luzes sobre o Rio Mersey, você e seu amô… Se preferir, acharás por ali opções mais econômicas.
14h – Tateando centros culturais
Do restaurante, a gente enxerga complexos culturais do Albert Dock como a Tate Modern, esse idolatrável museu gratuito, a não ser em algumas exibições especiais. Bastam 5 minutos de caminhada entre um e outro.
O Albert ainda reserva museus como o International Slavery, sobre escravidão e o Merseyside Maritime, ambos grátis; e o Beatles Story. Este, ao contrário do British Music Experience, não tem super relíquias, e sim réplicas de coisas como o Yellow Submarine e o quarto branco do Lennon. Eu já os tinha visto em SP na Beatlemania Experience 2017. Mas vale a ida.
20h – Cavern Club, o cavernoso
Após uma descansadinha em berço esplêndido na macia cama do Hope Street Hotel, na rua homônima, localização preciosa para desbravar Liverpool, cidade esta para andar, já que tudo é perto e a mobilidade é abundante.
Com custo-benefício, o lugar já hospedou gente como a ex-secretária americana Condoleezza Rice. Tem brasileiros e portugueses no staff, algo que pode facilitar, e guarda ainda um elegante restaurante, o The London Carriage Works, com pratos a partir de £ 7.
Foi o combustível para rumar ao Cavern Club, a lendária casa noturna onde os Beatles debutaram, no numero 10 da Matthew Street, também no Centro, num miolinho cheio de baladas e restaurantes.
Não é exatamente o mesmo prédio do Cavern original, de 1957, já que, devido a uma decisão do conselho local, este foi demolido nos anos 1970 e reconstruído nos 1980, usando o mesmo design e a maioria dos tijolos originais. Tijolos externos estes com nomes de lendas do rock.
Ao menos metade dos presentes havia completado 50 anos. A vibe é muito legal. A banda residente, The Cavern Club Beatles, troca de roupa, de caracterização conforme a época do disco. Os caras são idênticos, como comprovei quando entrara ao som de With a Little Help From My Friends, uma das minhas canções afetivas.
Como não havia acesso total para deficientes (sou cadeirante), me ofereceram água como cortesia, uma espécie de “pedido de desculpas”. Simpático.
DIA 2
10h – Casa do Lennon, do Paul…
Essa exploração boa dos Beatles é algo recente, vem de uns dez anos. O produto turístico mais profundo é o Fab Four Taxi Tour. Dura duas horas, mas o meu deu quase três, pois o Eddie, o gente finíssima que conduz o passeio, é apaixonado por guiar Penny Lane, o nome de seu táxi negro, daqueles vintage britânicos.
Custa £ 55, mas se dividir em cinco pessoas sai £ 11 cada. A gente aprende muito ao visitar as casas de todos eles, é fácil achar o endereços delas na internet – a do George era bonitinha, mas o calvário do banheiro externo deve ter aflorado a sensibilidade do cara.
Passa-se também pela rua Penny Lane, pelo orfanato Strawberry Fields (16 Beaconsfield Road) e pelo túmulo que tributa Eleanor Rigby, que fica do outro lado da rua da igrejinha que sediou o primeiro encontro entre John Lennon e Paul McCartney, em 1957.
13h30 – Almoço e bebida local
Quem curte cerveja ou gin pira no H1780, que fica no quarteirão inventivo da cidade, o Baltic Triangle. O lugar produz breja Love Lane e o gin The Ginsmiths. Lá rola também o The Ginsmiths Experience, com tours de cerveja e chás da tarde com gin. No pedaço você também pode comer e beber no Craft Minded e no Kiosk.
16h – Futebol, sim!
Inventores do futebol, os caras são fanáticos e as duas equipes da cidade, curiosamente, estão separadas por apenas 18 minutos a pé. Anfield é o estádio do Liverpool, e o Goodison Park, casa do Everton. Se não puder ver o espetáculo de suas torcidas num jogo, vá aos tours nos estádios.
20h – Jantar modernex
Hora de ir ao Bluecoat, o hub moderninho e cultural da cidade, cheio de restaurantes com belas vistas e eventos de música, dança, arte performática e literatura.
No dia seguinte, para a última impressão de Liverpool ficar ainda melhor, estavam dando gratuitamente café e água na estação South Parkway, onde eu pegaria o Britrail para Londres.
Era outro”pedido de desculpas”, como o do Cavern Club, pois a estação central estava em reforma e estávamos nesta outra. Isso que é hospitalidade.
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