Como, quando, onde e com que dinheiro voltaremos a rodar o mundo? Estas são as perguntas do milhão, na era pandêmica, para todos os que orbitamos em torno do universo das viagens. Enquanto o turismo global hiberna, com fronteiras fechadas e bilhões de pessoas confinadas, está em andamento uma série de ações para adaptar a indústria ao mundo pós covid-19. Mas, por enquanto, o fato é que temos muito mais dúvidas do que certezas sobre como será essa “nova normalidade”.
Ao que tudo indica, controles de temperatura corporal, túneis de desinfecção, oceanos de álcool gel e máscaras serão o novo pau de selfie. Também antevemos aviões, restaurantes, navios e resorts com novos limites de capacidade, assim como festivais, conferências e outros tipos de eventos que movem o calendário dos globe-trotters sendo moldados à era do petit comité.
Na última terça-feira, Rachel Verano e eu discutimos “Viagem e FuTurismo” em uma live (se você perdeu, clique aqui para ver).
Mas, além de encarar um desafio logístico-sanitário para adaptar-se à nova realidade, o mercado turístico deverá afrontar a maior crise de confiança de todos os tempos. Após mais de dois meses fechados em casa, temendo um inimigo invisível, não seremos os mesmos. Se atualmente temos medo de ir ao supermercado, como iremos até a Austrália? Esta é a pergunta que tenho feito a mim mesma cada vez que alguém ultrapassa a barreira virtual do 1,5m para alcançar um tomate à minha frente ou na fila do caixa.
Pasito a pasito, suave, suavesito também terá que ser o nosso ajuste mental à nova realidade. Nos últimos dias, vi algumas entrevistas com especialistas alertando sobre o risco de que essa volta às ruas pode não ser tão fácil como pensamos do ponto de vista psicológico. Não tenho a menor dúvida disso. Estamos passando por um trauma e é natural que isso tenha consequências.
No pós 11 de Setembro, o medo de viajar de avião tinha um foco bem concreto: terrorismo. Ainda assim, pelo menos para a maioria das pessoas, o risco continuou parecendo algo distante e improvável, como ser atingido por um raio. Atualmente, o inimigo não apenas é invisível e indetectável pelo raio-x, mas muito mais próximo – quem não conhece alguém que adoeceu ou faleceu?
Nessa longa retomada da confiança na indústria do turismo, alguns setores serão mais afetados que outros e precisarão de uma revisão drástica para seguir existindo. Na linha de frente das vítimas do coronavírus estão os cruzeiros. Em tempos de menos (gente) é mais (seguro), os mastodontes dos oceanos parecem ser “os” lugares onde ninguém em sã consciência quer estar. A tendência, portanto, é que passem a viajar com menos passageiros e condições de higienes à beira do TOC. Albergues da juventude, com quartos coletivos, também devem tardar a engrenar novamente. Para não quebrar, imagino que muitos devem trocar os dorms por quartos privados, além de suspender baladinhas no bar e outras formas de socialização. Grandes clubes, de Ibiza a Santa Catarina, terão que inventar novas experiências sem muvuca e suor coletivo – o que talvez signifique um golpe de misericórdia num lifestyle que já andava meio mal das pernas.
Enquanto ir à padaria continuar sendo considerado esporte radical, no entanto, tudo isso ainda parece distante. Por hora, assim como boa parte da humanidade, almejo apenas uma voltinha ao ar livre. Num futuro próximo, redescobrir as nossas cidades será o segundo passo. Viagens de carro a lugares familiares virão em uma próxima etapa. Uma vez reativadas as linhas aéreas e ferroviárias, alguns começarão a arriscar deslocamentos curtos de avião ou de trem dentro das fronteiras nacionais, ainda pendentes de possíveis novas ondas de contágio e eventuais quarentenas. Daí a cruzar oceanos de forma rotineira, sem medo de ficar “preso” no exterior por um novo confinamento, teremos um longo caminho pela frente.