Nova prefeita de Barcelona estuda maneira de frear turismo de massa
O número de turistas em Barcelona quase triplicou na última década. Hoje em dia, mais de 7,5 milhões de pessoas visitam a capital catalã ao ano
Barcelona vive um dilema. A cidade foi tão eficiente em projetar-se ao turismo internacional nos últimos 20 anos que, vítima de seu sucesso, agora discute uma forma de conter a avalanche. Esse foi o tema de uma reportagem (clique aqui para ler) recém publicada pela revista britânica The Economist. E esse vem sendo o tema de muitas discussões na cidade ultimamente.
O número de turistas em Barcelona quase triplicou na última década. Hoje em dia, mais de 7,5 milhões de pessoas visitam a capital catalã ao ano. A esse número somam-se 2,5 milhões de cruzeiristas, que desembarcam anualmente (para passar o dia) numa cidade de 1,6 milhões de habitantes. Para que se tenha uma ideia, o Brasil INTEIRO recebe cerca de 6 milhões de turistas estrangeiros ao ano.
Visitei Barcelona pela primeira vez em 1998. Mudei de mala e cuia pra cá em 2000 e sou testemunha ocular desse boom turístico. Assisti de camarote alguns bairros sendo totalmente modificados pelos novos hotéis e apês de aluguel de temporada (o exemplo mais dramático é a Barceloneta: clique aqui para ler o post) e deixei de frequentar uma série de lugares por causa da superlotação.
Pode parecer mimimi. Afinal de contas, que os visitantes geram emprego e renda todo mundo sabe. Mas, por outro lado, o turismo de massa acarreta uma série de efeitos colaterais nocivos (especulação imobiliária, saturação dos meios de transporte, gentrificação, entre outros) que devem ser avaliados e controlados para o bem de todos – inclusive dos turistas. E é isso que a nova prefeita de Barcelona pretende fazer.
Em 2013, durante protestos contra os despejos por falta de pagamento de financiamentos (um dos maiores dramas que resultaram da crise econômica que a Espanha atravessa desde 2008), uma estudante de filosofia vestida de Mamãe Noel foi arrastada por policiais armados e ganhou as páginas dos jornais. Era Ada Colau, 41 anos, a nova prefeita de Barcelona, eleita com 25% dos votos nas eleições municipais de maio de 2015. Líder do movimento em defesa dos afetados pela crise do financiamento imobiliário, ela conseguiu impedir centenas de despejos e é uma cara do novo cenário político espanhol, em que os novos partidos, fundados a partir do Movimento dos Indignados, vêm ganhando terreno sobre as grandes forças políticas tradicionais.
Vejam o que ela disse em entrevista ao jornal El Periodico (clique aqui para ler na íntegra):
-Se o turismo invadiu a cidade, como se deve corrigir a situação?
-O turismo é um ativo da cidade, uma fonte econômica. Mas é necessário governá-lo. Deve-se evitar guetos que afugentam os moradores, como por exemplo o centro histórico. A situação de bairros como Ciutat Vella, Barceloneta e os arredores da Sagrada Família é insustentável. É preciso decretar moratória de novas licenças, fazer um levantamento exaustivo dos alojamentos turísticos de todo tipo, combater a ilegalidade e incentivar o legal. Temos que reverter a taxa turística nos bairros que mais sofreram com o turismo de massa. E sobretudo traçar um plano estratégico contando com os moradores, coisa que nunca foi feita.
Pode parecer tudo meio utópico, mas falar sobre isso já é um bom começo. Outro dia, conversando com a responsável de comunicação do turismo de Amsterdã, ela me contou que a prefeitura da cidade subsidia o aluguel de vários edifícios no centro justamente porque não quer deixar que esses apartamentos valorizadíssimos caiam na mão de especuladores e terminem por fazer com que o bairro perda o seu caráter. Se eu já tinha uma admiração enorme pelos holandeses, eles subiram ainda mais no meu conceito.
Antes de ser eleita, Ada Colau também andou dizendo que gostaria de fazer as contas para ver se os cruzeiros realmente trazem benefício para a cidade, que hoje em dia é um dos principais portos do mundo para transatlânticos. Espero ansiosamente pelo resultado dessa análise. Como já afirmei aqui no blog algumas vezes, o crescimento imparável da indústria dos cruzeiros pede desesperadamente um planejamento, antes que cidades como Veneza, Santorini e Barcelona sejam sufocadas pelos mastodontes flutuantes sem que seus moradores se beneficiem com isso.
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