48 horas na Ilha de Marajó, no Pará
Destino espetacular e menosprezado em iguais proporções, a Ilha do Marajó proporciona dois dias de muito descanso
Antes que você comece a ler este post, gostaria de compartilhar o meu amargo arrependimento. Ficar apenas 48 horas na Ilha de Marajó foi um pecado. Em um mês viajando pelo Brasil, passando como um relâmpago por São Paulo, Rio de Janeiro e Belém, foi só nesse mísero espaço de tempo que eu consegui descansar, desconectar e divagar. Ou seja, finalmente entrar no modo férias. Queria muito que essa sensação tivesse se prolongado. E realmente não sei onde estava com a cabeça quando decidi planejar uma viagem tão corrida.
Quer dizer, sei sim. A Ilha de Marajó é um destino espetacular e menosprezado em iguais proporções. Elaborei uma teoria tabajara segundo a qual a ilha não é lá muito fotogênica. Ao vivo, das mangueiras de Soure à infinita Praia do Pesqueiro, tudo é dez mil vezes mais bonito do que em todas as fotos que tinha visto até então. Acabei não botando muita fé e me dei mal. Tudo isso pra dizer que, sim, dá pra conhecer os grandes hits do Marajó em 48 horas. E, sim, o novo barco rápido sobre o qual falei no último post tornou esse tipo de bate-volta extremamente viável. Mas, vai por mim, o lugar merece uma semaninha de imersão e bem bom. Você vai voltar novo pra casa.
DIA 1
10h – A praia da Barra Velha
O Expresso Tapajós vindo de Belém atracou no píer de Soure pontualmente às 10h. Uma vez em terra firme, pegamos duas motos-táxis até a pousada Canto do Francês (bonitinha, simpática e em conta). O trajeto demorou uns cinco minutos. Deixamos as mochilas no quarto e já subimos em outras motos-táxis que demoraram uns dez minutos em chegar à Praia da Barra Velha, a mais próxima do centrinho de Soure.
Era o dia do Círio de Salvaterra, a festa mais importante do povoado vizinho. Ou seja, a praia estava praticamente deserta, uma dádiva. Nos alojamos numa barraquinha simpática, pedimos um peixinho e atingimos o nirvana. O acesso à Barra Velha é feito por uma passarela que atravessa um mangue lindo de morrer (sua vantagem em relação à concorrente, Praia do Pesqueiro). A vida foi bela até a praia encher (de leve) e o brega começar a bombar pesado na caixa da barraca. Daí o jeito foi fugir para uma mesinha mais afastada, à sombra de uma árvore. Nada mal… nada mal…
18h – Uma voltinha por Soure
Devo confessar que preferi dar uma bela dormida depois da praia. Mas você pode aproveitar esse tempinho depois que o sol cai (antes disso é muito quente) para dar uma voltinha por Soure, comer um tacacá na pracinha principal (onde fica o píer), dar uma olhadinha nas lojinhas de artesanato e sentir o clima. Depois me conta como foi.
20h – Jantar no Ilha Bela
Os hotéis e pousadas têm restaurantes, alguns bem falados. Mas eu sempre prefiro ir aonde o povo está. Perguntando aos locais, cheguei até o Ilha Bela, que fica bem pertinho do píer, de frente para o rio Paracauari, cheio de brisa. Ainda que o humor da dona não estivesse lá essas coisas, o filhote na chapa com arroz, feijão e farofa saiu divino. E eles ainda são dos poucos da ilha que servem a venerada cerveja Cerpa original, aquela da garrafinha pequena e colarinho dourado. Ah, e o sorvete de açaí também é uma delícia e eles aceitam cartão! Yuhu!
22h – Volta à pousada
Na pousada, me recomendaram não voltar a pé depois das 21h ou 22h, nem caminhar pelas ruas mais escuras, porque assaltos têm acontecido. Que triste, não? Mas eu fui mesmo assim e achei bem tranquilo. Mas que fique claro que não era muito depois das 22h, não. Melhor ficar esperto.
DIA 2
10h – Praia do Pesqueiro
A moto-táxi até o Pesqueiro, a praia mais famosa de Soure, custa coisa de R$ 12 por trecho. E, como sempre, você precisa combinar com o motoqueiro o horário da volta, já que os celulares praticamente não funcionam na praia. Por via das dúvidas, é melhor deixar para pagar tudo no final, para não correr o risco de ser esquecido (não tive nenhum problema com isso e os táxis foram super pontuais, impressionante). A Praia do Pesqueiro tem dunas suaves e é enoorrrrme, vaaaasta, maravilhooooosa. Tive a honra de estar lá numa segunda-feira: totalmente vazia. A maré, que trabalha imensamente na Ilha do Marajó, estava baixa quando cheguei. Nessas condições, é preciso caminhar um bocado até chegar ao rio que se mistura ao mar. Mas, céus, que caminhada…. Só o barulho do vento nos ouvidos, e várias piscininhas naturais cristalinas pelo caminho implorando por um pit-stop. Talvez o meu melhor momento das férias tenha sido esse: deitar na água quentinha e cristalina e relaxar. Inesquecível. Tanto é que até lamentei a hora em que a maré subiu. Mas só um pouquinho. Porque quando a maré “lança”, como dizem os locais, o cenário fica ainda mais espetacular, com um braço de rio (ou será mar?) invadindo a praia, perfeito para nadar. Nesse dia aprendi algumas lições. Cerveja em Marajó é só de dois em dois dedinhos (o vento parece um secador de cabelo e esquenta a bebida em segundos). É melhor entrar na água arrastando o pé, para não correr o risco de pisar numa arraia (chutá-la é melhor). Farofa com vento não dá certo.
18h – Voltinha por Soure
Putz, hoje foi a rede quem falou mais forte. Mas, sério, vale dar uma voltinha por Soure no fim da tarde, comer tacacá, ver o movimento…
20h – Jantar do Patu-Anu
Este foi o segundo restaurante mais indicado pelos locais, bem pertinho do píer. O lugar é decorado, se é que se pode dizer assim, com uma enorme “releitura” da Última Ceia, de Da Vinci. Também tem novela da Globo bombando na TV. Mas a mocinha que atende é tão fofinha que você esquece tudo rapidinho. O prato estrela é o famoso filé marajoara, de carne de búfalo (ultra macia!) e o famoso queijo local, feito com leite de búfala — ele parece um requeijão mais durinho, super cremoso, delicioso. Encontrar o queijo estava super difícil durante minha passagem pela ilha e essa foi uma das raras ocasiões em que consegui provar (a outra foi no café da manhã da pousada, em pedacinhos ínfimos). Isso porque, durante a estiagem, as búfalas acabam deixando de produzir leite e, portanto, falta matéria prima. Este ano foi super seco na Ilha do Marajó. Uma pena.
DIA 3
10h – Visita à Fazenda São Jerônimo
A fazenda do senhor Brito é uma verdadeira celebridade local. Ela já foi cenário de várias novelas e, no começo de novembro, palco do Banquete Ópera (!!!) que aconteceu em pleno mangue e que ainda teve direito a festim organizado pelo chef Andoni Aduriz, do restaurante basco Mugaritz (considerado um dos melhores do mundo). Saiu até no Jornal Nacional. Mas, segundo o senhor Brito (cuja filha é atriz), o investimento na infraestrutura do espetáculo acabou com as finanças da fazenda. Talvez por isso, o preço do passeio ande tão salgado.
De qualquer forma, vale muito a pena. O primeiro passo é um passeio de canoa por um igarapé maravilhoso durante o qual é possível avistar vários pássaros (faltou o todo-poderoso guará, que costuma aparecer no fim da tarde). Depois, uma caminhada por uma praia deserta, maravilhosa — que os guias quiseram fazer numa rapidez absurda… eu teria ficado ali um tempinho, feliz da vida. Em seguida, vem a melhor parte, que é uma caminhada pelo manguezal mais bonito do planeta terra, sobre uma ótima passarela de madeira (que foi todinha restaurada para receber a tal da ópera). Na etapa final, a regra é montar no lombo do búfalo. Achei divertido nos primeiros três minutos. Depois comecei a morrer de calor, de pena do magro e desanimado Marajó, e dos guias que vinham atrás de mim reclamando da vida. Enfim…
12h30 – Almocinho em Soure
Como já tinha feito check-out na pousada, fui direto para o centrinho almoçar (outra vez no Patu Anu, porque é mais próximo ao píer). Foi o tempo certo de dar uma descansadinha e embarcar às 14h30 com dor no coração. Quero muito voltar, conhecer a ilha mais a fundo, ir à Salvaterra, visitar uma fazenda de criação de búfalos, ver uma apresentação de carimbó e, sim, dar aquela voltinha por Soure…
Busque hospedagem na Ilha do Marajó
Leia tudo sobre o Pará